Por Paulo Moreira Leite
Há um dado relevante na reportagem de capa de Ricardo Mendonça publicada pela Época. A revista quis saber se os brasileiros concordariam em pagar um novo imposto para saúde. A resposta é sim.
Desde a posse do governo Dilma que se discute o assunto em Brasilia. Num país onde gastos do governo costumam ser associados apenas a desvios e a corrupção, como se não produzissem nada de útil para a sociedade, a derrota da idéia parecia uma barbada.
Recentemente, até a bancada do governo baixou a guarda e evitou debater o assunto quando a Câmara votou a emenda 29, que define gastos para saúde.
A resposta na pesquisa: 51% são a favor e 46% são contra.
O resultado é uma surpresa em parte. É verdade que a denuncia dos impostos altos e injustos mobilizou a classe média e tornou-se ponto de honra dos empresários. A discussão sobre carta tributária tem uma base na realidade: muitas pessoas efetivamente pagam impostos demais.
A malha de tributos é tão complexa de chega a ser irracional e cria entraves para o desenvolvimento.
Em função destes argumentos, muitas vezes justos, parecia que a população chegara a uma conclusão complicada: a de que não adianta aumentar as receitas da saúde pública porque o atendimento iria continuar ruim como sempre foi.
A pesquisa mostra que não é assim. Por uma margem de 63%, os brasileiros reclamam que a carga tributária é alta demais. Ao mesmo tempo, concordam em pagar mais — desde que seja para a saúde.
Quanto mais pobre o eleitor, maior seu apoio a idéia. São essas pessoas, na verdade, que mais utilizam o SUS. Enfrentam a falta de médicos, a demora para fazer exames complicados, o atendimento que nem sempre é educado. Conhecem os chamados problemas de gestão, gravíssimos, mas tem certeza de que também faltam recursos.
Antonio Lavareda, que dirigiu a pesquisa, disse a Epoca que este apoio do eleitor a um novo imposto reflete seu desalento. “O problema da saúde no Brasil é tão grande, mas tão grande, que as pessoas até topam pagar mais para o governo se for para resolvê-lo.”
Muitas pessoas consideram que, como os pobres são os que mais utilizam o sistema público de saúde, são aqueles que tem maior interesse em ver melhorias nos serviços. Tem lógica.
Tem lógica mas talvez não seja inteiramente correto.
Um novo imposto para saúde irá ajudar toda pessoa que decidir usar o serviço público de saúde, sem distinção de origem e classe social. Não é, portanto, uma espécie de egoísmo socialmente aceitável, já que se destinaria apenas aos menos favorecidos.
A pauperização da saúde pública empurrou a classe média para os planos privados, que funcionam e só podem funcionar pelas regras de ferro da economia de mercado: recolhem gordas mensalidades de quem pouco utiliza seus serviços, mas fecham as portas para o cidadão que já chegou naquela fase da vida em que todos precisam de atendimento regular e caro — e só representa prejuízos.
Muitos brasileiros de classe média que vivem com o orçamento apertado pagam pequenas fortunas mensais para planos de saúde que definem o atendimento de acordo com o talão de cheques do fregues. Criam dificuldade para aprovar exames sofisticados, controlam internações e pressionam médicos a reduzir custos — sem falar em honorarios ridiculamente baixos, que levaram a categoria a realizar até greves nas últimas semanas.
A discussão de um novo imposto para saúde não implica em reforçar o caixa do SUS com bons trocados a mais. Envolve um esforço para resolver problemas de gestão, para ampliar o conceito de quem deve ser atendido. Essa é a discussão.
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